sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

MENERES PIMENTEL





                                                     MENERES PIMENTEL


Tenho uma especial recordação do Dr. Meneres Pimentel, falecido a 12 de Fevereiro. São óbvios os elogios que lhe destinam; uns de circunstância, outros, porque decorrem de um verdadeiro sentimento e convicção. Na parte que me diz respeito, é nesta 2ª acepção que me refiro a este distinto senhor. Recordo-me da sua personalidade e porte, quando interveio em pelo menos dois colóquios que a então Comissão-Pró- Associação Sindical da PSP levou a cabo, numa altura em que a perseguição afectava não só os dirigentes deste movimento (quem olvidará do "desterro" do Comissário Santinhos a Bragança) como ainda aqueles que imbuídos de um sentido democrático e de respeito pela Constituição, defendiam o associativismo representativo na PSP (caso do Dr. Almeida Ribeiro, grande defensor deste associativismo enquanto foi Provedor de Justiça, não tendo  sido reconduzido precisamente por defender esta causa). Conhecedor do seu perfil democrático, convidei-o para apresentar o livro em que sou co-autor - " O SINDICALISMO na PSP - Medos e Fantasmas em Democracia", na sede da Associação 25 de Abril, salvo erro, em Maio de 2002. Aqui fica o preito da minha homenagem e o meu reconhecimento.          

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

A JUSTIÇA NO ESTADO NOVO




                                                   A JUSTIÇA NO ESTADO NOVO


Ontem, dia 11 de Fevereiro 2014 tive a oportunidade de moderar a 1ª Conferência de um Ciclo de 12 outras, comemorativo dos 40 anos da existência do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP), sob o tema base - O Futuro tem História. O lema da Conferência era " O Ministério Público na transição do Estado Novo para a Democracia". O elenco de conferencistas abrangia: Antero Monteiro Diniz (Conselheiro do STJ, Auditor de Justiça no Ministério de Justiça 1974/1978; ex- Ministro da República e depois o 1º Representante da República na Região Autónoma da Madeira); Dr. Levy Batista (Advogado, Director da "Seara Nova", ex- Delegado do Procurador de República em Luanda; advogado de defesa nos Plenários do Estado Novo e co-fundador do Conselho Português para a Paz e Cooperação) e a Prof. Drª Maria Inácia Rezola (investigadora integrada - Doutorada em História sob a tese "O Conselho de Revolução e a Transição para a Democracia em Portugal, sendo na actualidade, docente na Escola Superior de Comunicação Social).
O acontecimento durou mais de 2 horas. Houve um breve debate, tendo eu, no final,  na qualidade de moderador, sublinhado que muito mais ficou por dizer e esclarecer. 
Variadas foram as questões abordadas, tendo os dois 1ºs intervenientes assinalado as suas próprias vivências e experiências, bem como o entendimento sobre como as coisas se processavam quer nos Plenários, quer nos bastidores da alta política particularmente no alvor do 25 de Abril pelo envolvimento dos cargos que por esta altura ocupavam no aparelho do Estado, quer ainda quanto à forma como a justiça era ministrada e funcionava, tendo em conta os pilares personalizados do sistema no regime ditatorial. Por sua vez, a Drª Rezola, apresentou a contextura da sua investigação particularmente no tocante aos saneamentos e a extensão de que se revestiu neste período.
A gravação realizada permitirá seguramente fazer uma apreciação mais detalhada de tudo quanto ali passou e foi dito.
O rescaldo da Conferência permitiu neutralizar qualquer tentativa ou perspectiva com vista a branquear ou de certo demonstrar que se tratava de um regime "amolecido", bem distanciado do III Reich,  apesar da complacência com que o então Ministro de Justiça, Prof. Dr. Cavaleiro Ferreira o encarava em matéria de orgânica legislativa.
Ficou relevante a questão da "promiscuidade" entre magistraturas existente no salazarismo. A acuidade  desta questão veio à tona quando foi revelado que no aparelho da Procuradoria Geral de República, os Ajudantes do PGR, eram recrutados entre os Delegados do Procurador de República, que melhor classificação haviam obtido no concurso para juiz, ao qual os Delegados eram, na altura própria , concorrentes obrigatórios. Entre os Ajudantes havia figurado  o conferencista Dr. Monteiro Diniz. Na óptica que transmitiu, tudo parecia assim ajustar à medida do sistema. Sendo nesta altura o M.P. , magistratura vestibular, e como bem assinalou o conferencista Dr. Levy Batista, a carreira que o Delegado visava ter era, a de ser Juiz. Mas, então, o que levava os melhores classificados no concurso para juiz, a abdicar, a dado passo, do exercício dessas funções, para aceitarem o lugar de Ajudante do PGR? Segundo, ficou aclarado, o Juiz bem classificado era convidado para aquele cargo. A promiscuidade da magistratura resulta disso: M.P. (Delegado) --- classificado de juiz --- reconversão para M.P.  mantendo a sua categoria profissional de magistrado judicial!
Ora, o projecto salazarista, seguido do marcelismo, foi já qualificado com uma "ditadura do de direito". Neste regime a própria violação dos direitos eram consagrada por leis positivas, aplicadas através de um sistema dispositivo. Por sua vez, é sabido que o Estatuto Judiciário de 1927 determinava que o PGR prestasse declaração ou compromisso de honra perante o Ministro de Justiça. Este podia estabelecer e dirigir ao PGR directrizes de ordem geral, as quais eram obedecidas, figurando entre as atribuições do Ministro, nomear, colocar e exonerar magistrados e exercer a respectiva acção disciplinar. É pois caso para se indagar: O que levava então os juízes aceitar o convite para o retorno ao M.P. sob as ordens de um PGR assim condicionado, abrindo mão da "independência" de juiz? Não deixa aqui de se notar  uma certa perversidade do sistema.
Para se conhecer o futuro, mister se torna conhecer o passado, tanto mais que, muitos dos que exerciam funções e partilhavam responsabilidade no sistema anterior, cedo tomaram assento no sistema ora aberto, no quadro do que se pretendia ser o real processo da democratização da justiça. E, de momento, por cá fico.