quinta-feira, 5 de maio de 2016

PANAMA PAPERS - As duas faces do seu significado


O destinatário deste "post" sou, antes e acima de tudo, eu próprio. Todos sabem o difícil momento económico financeiro que Portugal, e portanto, todos nós atravessamos. A dívida para com as instâncias europeias (BCE, Comissão Europeia e a FMI - os que constituem a Troika) é enorme. Em 29.08.2012 orçava em 188,8 mil milhões de Euros  (nem sequer faço ideia desse montante, mas existe). Há  pois falta de dinheiro. Segundo dados do Banco de Portugal (ref. Jornal de Negócios de Fev.2013 - in Portais) esta dívida atingiu 203,4 mil milhões no final de 2012, o equivalente a 122,5% do PIB e em Março deste ano subirá para 233 mil milhões. Tudo isto é contabilidade bancária, da qual muita coisa me escapa. Mas uma coisa é certa. A dívida aumenta dia a dia devido a juros que acrescem ao capital em débito. 
Há no entanto uma outra realidade que vai tendo lugar: Entre 2010/2014 foram transferidos de Portugal para off-shores e territórios de tributação privilegiada cerca de 10.200 milhões de euros (repito, nem faço ideia do montante em causa). 
Segundo está divulgado há muitos off-shores por esse mundo fora, sendo o das Ilhas Caimão o preferido pelos transferidores portugueses e que são particulares, empresas, escritórios de advogados,bancos e fundos sediados em Portugal.
A 1ª face: Está assumido que a fuga de capitais e inerentes depósitos ficam a dever-se à fuga ao fisco ou numa linguagem mais "soft" para não pagar uma excessiva taxação, no sentido de que os autores da fuga  até gostariam pagar os seus impostos como cidadãos de bem, mas a carga é que é demais. Neste sentido, o Sr. Junkers, quando 1º Ministro de Luxemburgo, condoído com as agruras desses senhores até abriu as  portas do seu país para acolher os capitais em vias de martírio, assegurando domicílio nesse país a troco de uma taxação muito reduzida, facilitando assim a fuga dos países da União Europeia para o Luxemburgo - mais um paraíso fiscal - o que lhe viria a valer a honra de vir a suceder Durão Barroso ou seja, Presidente da própria UE!
A 2ª face: Nesta sequência bem se poderia perguntar donde vem tanto dinheiro, que não pudesse ser investido no próprio país do " transferidor", atividade que cedo passou a ser conhecida como de lavagem de dinheiro, colheita de frutos de corrupção, envolvendo nomeadamente luvas por transações de material pesado utilizado na construções, em material hospitalar, ou o destinado à segurança e defesa e outros do género. Qual então a razão desse desvio de dinheiros? O singular motivo há de encontrar-se na dinâmica reprodutiva desse capital, ainda maior e que supera a mediania do lucro que pudesse ser auferido no próprio país. Tal só pode ocorrer quando este dinheiro é investido em atividades como o tráfico de drogas, comércio de armas e armamento, tráfico humano, e outras atividades do tipo, e que de comum tem o serem todas de natureza e alcance ilícito, ilegal e imoral. Esclareça-se que este entendimento não implica o direto envolvimento dos investidores nestas atividades com conhecimento de causa mas a sua complacência e aceitação implícita na aplicação do capital nestas atividades torna-os coniventes e cúmplices nas mesmas. Neste enquadramento já não se trata de discutir sobre a legalidade das offshores, da licitude ou ilicitude da sua ação mas sim o da afetação dos seus fundos, os negócios que proporciona e a atividade que desenvolve.

E aqui temos o caso do Panama Papers. Devo desde já assinalar que não  me preocupa tanto os depósitos de um Leonel Messi, do Vilarinho ou de qualquer outro particular mesmo português. Dou neste aspeto um benefício de tolerância pelo sentido de irresponsabilidade que tem nas coisas do Estado. Foi patético porém ver pessoas como Ângelo Correia, ex-governante e outros da mesma franja, a desculpabilizarem-se. E os nomes ainda não foram revelados, na sua grande maioria. Porque?
E aqui se coloca a questão fulcral: como foi possível este desvio de divisas? Vamos acreditar com Vitor Constâncio, que antes de ocupar o cargo na Europa e enquanto era Governador do Banco de Portugal, chegou a afirmar que desconhecia da existência de offshores!? E como entender a sua proeza mais recente - a de recusar prestar declarações perante uma Comissão Parlamentar, se nada tem a esconder? Esta recusa pode vir mesmo a configurar um crime de desobediência, se a convocatória tiver sido regularmente feita. É que uma coisa é não comparecer, e outra a de comparecer e recusar responder, optando pelo silêncio. 
E a "paródia" para o mal dos nossos pecados prossegue! O atual  Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, no seu propósito de salvar a honra da casa apelidou a situação de "fragilidades de democracia". Mas todos vivemos e defendemos a democracia, mas seguramente não para sustentar estas fragilidades. As fragilidades eliminam-se, pondo fim à fuga de capitais; através de vigilância e inspeção permanente e adoção de medidas impeditivas para esta tramoia, levando os malandros a responderem perante a justiça. Qual o papel e responsabilidade do Governador do Banco de Portugal?
Houve quem dissesse que só o montante da fuga de capitais dava para pagar senão toda pelo menos uma grande parte da dívida que tanto aflige Portugal, equilibrar a balança de pagamentos, gerar mais investimento, mais emprego e melhorar grandemente a vida dos portugueses.
A esperança nunca morre. Será?
   
    

segunda-feira, 28 de março de 2016

AVISO AO XENÓFOBO(A)


Os atentados em Bruxelas, ocorridos há dias e onde há a lamentar 35 mortos  ainda se fazem sentir nas mentes, nos corações e nos gestos de solidariedade das pessoas, O mesmo sentimento devia acompanhar  a carnificina ocorrida num outro atentado em Lahore (Paquistão), através de um suicida, num parque público, onde morreram 72 pessoas, incluindo 29 crianças. Há questão de dois dias, também se registou mais um atentado no Iraque e um outro no Iémen, também com mortos nos dois casos.
Hoje as agências noticiosas divulgavam uma marcha e distúrbios provocados pela extrema-direita na Bélgica contra os muçulmanos.
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E eis aqui o aviso - mais propriamente um apelo - à consciência e inteligência das pessoas. 
É certo que a grande maioria dos seus autores são de ascendência árabe, embora nacionais (em 1ª, 2ª ou ainda 3ª geração) dos países onde vivem e onde os atentados são activados. Em termos sociológicos a questão que porventura se poderá e deverá levantar nestes casos é o do grau de supremacia que a crença religiosa tem ou pode ter sobre a questão da nacionalidade. Este aspecto tem importância para enquadrar a problemática em termos da origem genética dos autores, da sua profissão de fé e da nacionalidade. Os exemplos acima referidos não indicam nem demonstram porém que apesar de muçulmanos ou árabes a prática do terrorismo tenha por alvo o europeu. Não tem pois sentido a onda de indignação contra os árabes em geral, por serem árabes, já que nem todo o árabe é terrorista, e os atentados são também praticados por árabes contra árabes.

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Num escrito anterior já referi que aos responsáveis cívicos e religiosos das comunidades muçulmanas espalhadas pelo mundo devem, a uma só voz reagir activamente contra o fundamento religioso que é invocado para a prática do terrorismo. afectando pela negativa particularmente as comunidades respectivas e derivadamente a religião muçulmana. Até agora pouco se tem feito nesta denúncia,          

           

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

ESTADO DE MAGISTRADO - "QUO VADIS?"



Estipula o artigo 89º da Lei nº 9/2011 de 12.04 (Estatuto do Ministério Público - EMP) que um magistrado do M.P. na situação de licença sem vencimento de longa duração não pode invocar aquela qualidade.....". Ora bem. Acaba de ser preso preventivamente um cidadão que tendo exercido funções de Procurador de República estava na situação de licença sem vencimento de longa duração.
Sucede que usualmente e em termos normais, um magistrado que tendo optado por esta modalidade de licença, pode, querendo retomar as suas funções, sem que alguém interrogue o que andou a fazer ou que cargos ocupou durante este interregno funcional. É este o regime em vigor na função pública. Mas é preciso notar que estamos no domínio da magistratura, uma função que tem a seu cargo a aplicação dos cânones de justiça, onde não basta parecer, pois é ainda necessário sê-lo. Aliás é o próprio  Estatuto a indicar o caminho quando assinala no seu artigo 81º.1. que "é incompatível com o desempenho de cargo do M.P. o exercício de qualquer outra função pública ou privada de índole profissional salvo.....". Imagine-se que um personagem nestas condições decide fazer parte de uma quadrilha e depois decide retomar as funções anteriores. Quid juris?
Eis porque o sistema judiciário, nomeadamente através dos respectivos Estatutos deviam criar dispositivos que permitissem na circunstância assinalada, antes de reassumir as funções, conhecer o percurso do magistrado durante a licença de  longa duração, e ter a possibilidade de rever a situação através de processo adequado, prevendo-se nomeadamente a possibilidade de não reassumir as funções quando a actividade exercida seja incompatível com a dimensão profissional de magistrado.

             

domingo, 21 de fevereiro de 2016

OS PASSOS DO PASSOS


(Peço desculpas aos que me tem honrado com a consulta do Blog, por este interregno. Tal se ficou a dever a vários fazeres, nomeadamente envolvendo intervenções escritas).

Ora bem, vejamos como param as modas. Outra coisa não seria de esperar do Dr. Passos Coelho, depois que foi corrido como 1º Ministro de um governo de 17 dias, face à componente da esquerda que assumiu as rédeas de governação. Tem-lhe custado digerir (pois entender, seguramente entendeu e bem) o seu afastamento, limitando-se apenas a lamentar que assim não devia suceder pois o PSD até ganhou as eleições. A este propósito, limitar-me-ei a referir à insuspeita opinião do Prof. Dr. Diogo Freitas do Amaral - Visão, nº 1198 de 18/24.02.2016 - pg.50, sob o título "Os primeiros meses de Costa" que aqui dou por reproduzida e convido o leitor à sua consulta. Óbvio é que em democracia tem condições para formar governo quem desfruta de maioria parlamentar. Seria bom que o Dr. Passos Coelho demonstrasse publicamente que também entende de política pois o que esteve em causa nesta contenda é afinal uma governação de esquerda a contrapor-se a uma da direita, e nada mais. Sonhar e nivelar a sua candidatura de liderança do PSD, com a de um futuro 1º Ministro, é alimentar desejos e nada mais. Um lider político, mormente de oposição tem de demonstrar um discurso capaz e convincente e não como aquelas declarações que fez em Bruxelas a semana passada onde depois de afirmar que a troika e ele próprio cometeram erros,  mas que procuraram sempre fazer aquilo que era necessário fazer para responder aos problemas que existiam. Seria caso para dizer que pela boca morre o peixe, como se fosse necessário cometer erros para bem governar. Mas os erros corrigem-se. É o que o actual governo entendeu fazer, para grande mágoa do Dr. Passos Coelho. Mea culpa.....   

quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

AS SUBVENÇÕES E O ACÓRDÃO

A) O Acórdão(Ac.)nº 3/2016 de 13.01.2016 do Tribunal Constitucional (TC) gerou controvérsia por ter declarado a inconstitucionalidade de normas do Orçamento do Estado-OE(2015) relativo ao regime de subvenções vitalícias atribuídas a ex-titulares de cargos políticos. Este regime dependia de uma restrição - a chamada condição de recursos. No essencial tal significava que um ex-titular de cargo político quando auferisse mais de 2000€ em média mensal, calculada nos termos da lei, deixava de fruir da subvenção. O que decidiu então o TC? Que a restrição do OE era inconstitucional. A subvenção vitalícia assumia assim a sua feição integral passando a funcionar sem a restrição constante do OE. 
O Ac. assumiu mais relevo por ter sido publicado nas vésperas da eleição presidencial, por alguns candidatos salientarem que, se fossem eleitos, jamais peticionariam uma tal subvenção ou que a mesma era simplesmente de repudiar. Tudo bem, e cada qual procede como entende. Entre os que haviam requerido a declaração de inconstitucionalidade figurava a candidata Maria de Belém.
O Ac. foi votado por maioria com 8 votos a favor num conjunto de 13 conselheiros. Houve por isso 5 declarações de voto. As declarações de voto podem abranger: -votos de concordância acrescentando outros motivos para além dos referidos no acórdão; -votos de discordância com a decisão final;  -votos de discordância com os motivos mas concordando com a decisão e -votos de discordância com a decisão final. Vem esta referência a talhe de foice para significar que a figura de declaração de voto não é de molde a tirar força de validação à decisão judicial. E esta validação é essencial para imprimir certeza ao direito. O douto Ac. vale por si e de aplicação imediata.

Ultrapassa o propósito deste post estar a proceder à apreciação ou análise do Ac. em apreço. O que aqui se visa é apenas reconduzir o seu impacto ás suas justas proporções e de certo modo interpretar o alcance e o significado da onda de indignação insurgente que se lhe seguiu. Segundo clarificou o Sr. Presidente do TC, o Ac. não teve em vista tomar posição sobre se as subvenções são justas ou se deviam ou não ser pagas. O Ac. veio no entanto clarificar a motivação subjacente à atribuição da subvenção tal como decorria da lei, o que não repugna à Constituição da República (artigo 117º.2.).

(Anote-se que a figura de subvenções foi criada em 1985 pela lei nº 04/85 de 09 de Abril sendo que este regime foi até eliminado em 2005 pela lei nº 52-A/2005 de 10 de Outubro.Neste intervalo, tanto a lei como o regime de subvenções conheceram 6 versões distintas). Para o Ac. estas subvenções podiam não ter sido atribuídas, mas foram-no. O legislador ao atribuí-las agiu livremente e dentro desta liberdade podia alterar as posições que assumiu nesta matéria. Só que ao fazê-lo de modo como o fez no presente caso (sujeição à condição de recursos), violou o princípio de confiança dos peticionantes, ex-titulares de cargos políticos.
Mas diz-se no Ac. "O legislador não fica preso em quaisquer circunstâncias, à opção que tomou no passado, podendo legitimamente prosseguir reforçar a revisão restritiva do regime de subvenções afectando inovatoriamente a posição de quantos eram beneficiários ......o ponto decisivo consiste em saber se a restrição do OE/2015 nesta matéria foi desenhada de forma adequada às exigências constitucionais....... A nossa resposta é negativa". Assim sendo, o legislador poderá alterar a posição quanto às subvenções, mas não eliminá-las, sob pena de violar o  princípio de confiança dos destinatários que a Constituição consagra no seu artigo 2º. Nesta óptica a subvenção tem uma natureza compensatória, a sua razão perspectivada como uma recompensa por uma actividade entendida como um sacrifício e entrega pessoal à causa pública. À partida nada ou pouco teria a ver com a "condição de recursos" de que o ex-politico fosse titular. 

B) As reacções que se fizeram sentir, decorrem de um circunstancialismo variado. Em primeiro lugar, porque não são conhecidos casos de indigência ou de carência económica que afectem os ex-políticos sem obviamente por em causa as dificuldades económicas por que eventualmente possam passar, como aliás pode suceder com a generalidade dos cidadãos deste país. Em segundo lugar, é entendimento corrente que quem exerce actividade política é porque quer ou porque pode. Avaliando os prós e os contras da sua vida pessoal em todos os sentidos - pessoal, familiar, social e económica - faz a sua opção, pouco correspondendo à verdade dos que dizem que perdem dinheiro enquanto estão na política. É sabido que o tempo de exercício de actividade política assegura o retorno ao cargo anterior a que acrescem as remunerações e compensações que são atribuídas aos titulares no exercício do cargo político. Só forçadamente ou por expressiva raridade se poderá dizer que um político é-o por sacrifício, pese embora se reconheça a plenitude de dignidade e consideração pela função exercida. Constata-se mesmo que uma parte apreciável são profissionais com cursos superiores ou exercem profissões liberais ou do empresariado, pelo que a atribuição de subvenções passa a ser algo idílico. Em terceiro lugar, há que não menosprezar a situação de contenção e e a política de austeridade que vem sendo seguida no país, do que resulta revestir-se de uma ostentação atribuir e encontrar justificação para essas subvenções. 
Ter direito pode nem sempre ser sinónimo de justo embora juridicamente o possa ser. É neste patamar que a vertente reactiva ocorreu. 

Na mesma linha de apreciação se inserem as regalias, para não dizer outra coisa, de que beneficiam os Srs. Ex-Presidentes da República (Lei nº 26/84 de 31 de Janeiro), estas ténuamente referidas no douto Ac. Por mais alto e destacado que tenha sido o cargo, e mesmo que lhes caiba o papel de Conselheiros de Estado, não é de molde a justificar a atribuição de um gabinete, carro, uma secretária, um assessor, uma viatura com condutor e combustível. Pouco faltaria a atribuição de uma moradia. Estas atribuições nada tem a ver com a importância do cargo que desempenharam já que a sua projecção se esgota com a magistratura que exerceram e não é aferida uma expressa mais valia futura para o país. Qualquer actividade que venham a exercer terá que ser e geralmente o é em nome próprio; qualquer despesa que fizerem é em benefício próprio, em pé de igualdade com qualquer cidadão, Dos insignes personagens que conhecemos, são normalmente de posses capacitadas, com meios para disporem daqueles requisitos a custa própria quando necessitarem. O que acaba de se dizer é tanto mais oportuno quanto é certo vivermos num país com as dificuldades que tem.
Não é que o erário público se vá enriquecer muito mais caso estas regalias não sejam atribuídas. Trata-se apenas de princípios de um regime democrático, onde o que cada um beneficia tem a sua razão de ser, a sua necessidade e a sua vivência.     

domingo, 17 de janeiro de 2016

AS FÚRIAS DO FUTEBOL - OS PERIGOS


Há quem diga que a fobia do futebol é pior que no tempo de Salazar, quando fazendo grupo com o Fado e Fátima, contribuía para a alienação do povo, nomeadamente se desinteressando ou esquecendo que vivia num regime autoritário. O regime democrático que se seguiu ao 25 de Abril de 1974 veio demonstrar que a existência daquelas três manifestações nada tem a ver com a natureza de regimes políticos, particularmente se atendermos as novas modalidades em que se evidencia a correspondente evolução. Quanto ao Fado, manifestação artística e musical basta só atentar na maior qualidade dos seus e suas intérpretes (não menciono nomes para não falhar com qualquer omissão); quanto a Fátima, pese embora a sua afluência ser cada vez maior ao respectivo santuário, tal decorre sobretudo pelas difíceis condições materiais e emocionais da vida, na esperança de que melhores dias possam advir por graça e força da divindade em que se crê; quanto ao Futebol, é só apreciar a tecnicidade e virtuosismo dos jogadores e a destreza dos treinadores, formando equipas cada vez mais qualitativamente combativas para o gáudio dos adeptos e capacitação clubista, dando a alguns clubes até a possibilidade de competir no mercado bolsista. 
Se nada há a assacar de negativo aos primeiros dois FF, já o mesmo se não dirá quanto ao terceiro F. nomeadamente quando tal modalidade desportiva, considerada desporto-rei, é usada ou serve conscientemente como via para atiçar animosidade e sublevar ânimos. É atendível que num desafio, num campeonato ou num jogo competitivo sempre se queira ganhar o adversário, Os treinadores e os representantes máximos dos clubes, particularmente os mais cotados, sabem muito bem a força da afeição clubista que geralmente caracteriza o correspondente adepto. Este, melhor que ninguém será o consciente apreciador de como na sua óptica, o jogo decorreu, as falhas ocorridas, o autor ou autores das falhas e a crítica daí decorrente a atribuir ao responsável do acto praticado. Este é o "behaviour" normal que é de esperar de um adepto normal. E por cá se deve ficar, pois nenhum clube deseja adeptos de mentes doentias.
Ora é precisamente nesse ponto que cabe uma fulcral responsabilidade aos máximos responsáveis dos clubes e treinadores de equipas nos comentários e declarações que prestam no rescaldo de um jogo onde a respectiva equipa foi menos feliz, A fala que desenvolvem nesta ocasião, particularmente quando estão na presença de microfones e câmaras de TV mais parece o bate papo a uma mesa de café. Parecem esquecer a sua postura de responsáveis quando fazem imputações e comentários sobretudo relativamente ao árbitro. Ora um árbitro é sempre uma autoridade em cuja capacidade se confia para dirigir um jogo. Pode ser um mau árbitro ou um arbitro mau ou um arbitro que tenha feito uma arbitragem criticável. Porém, a crítica jamais poderá ser feita a quente pelos responsáveis do clube sem ser precedida de uma análise cuidada sob pena de a atiçar os adeptos podendo provocar reacções violentas ou tumultuosas, quando a oportunidade surgir. Casos de violência no desporto devem também ser apreciados sob este prisma.  

domingo, 3 de janeiro de 2016

O discurso terminal do Presidente da República



Se algo de positivo e realista se pode extrair do discurso "fim-de -ano" do Presidente da República é a sua coerência ou seja, a verdade segundo Cavaco Silva. São "tempos difíceis", disse ele. E é verdade. Mas que país é esse, "o país real" que visitou de lés a lés? Marcado pela "pobreza e exclusão". Então a indagação sacramental impõe-se. E, quem os proporcionou?
Vejamos: Este discurso é proferido a um escasso mês que se segue à entrada em funções do governo chefiado por António Costa. As andanças pelo país e a situação a que o Presidente da República alude, só podem reportar-se ao governo antecedente, o do Passos Coelho. Assim sendo, os dizeres de Cavaco Silva, que nunca (ou raramente) se engana, só podem estar a referir-se ao governo que protegeu, quanto mais não seja por perfilhar a "política seguida das últimas décadas" inspirada pelos "valores da civilização ocidental". Aí está o Sr. Presidente da República em todo o seu esplendor a tentar justificar a sua própria política quando foi 1º Ministro e a inspiração com que orientou toda a sua acção política.  

Afinal com as atinências que fez, o que quis o Presidente da Republica transmitir aos portugueses? Provavelmente que a "sua" política e a que mais recentemente patrocinou eram as mais adequadas para o país. O que não pode todavia é dissociar essas políticas, das consequências económicas e sociais que o pais teve que arcar, a começar, pela dinâmica de austeridade, o desemprego, a crescente emigração particularmente de jovens, os escândalos do BPN, do BES e mais recentemente do BANIF, e sobretudo de uma dívida perante a UE que não para de crescer. Se são essas as características do país real, então a lógica demanda que estão irremediavelmente comprometidas as consequências da política das últimas décadas que o sr. Presidente tão convictamente propõe para o futuro do nosso país. A proposta porém, não chega para branquear o regime que o economista Cavaco Silva defendeu e seguiu (fujo a comparações) no seu 1º ministeriado, pela simples razão de que políticas de resultados escuros não se podem branquear, mesmo alegando uma legitimação eleitoral ou motivando artifícios para uma estabilidade governamental. Não é em vão que foi precisamente a propósito do governo do Passos Coelho e da Presidência de República prestes a terminar que se suscitou pela primeira vez a questão de afastamento ainda antes do termo da legislatura de um governo eleito ou da necessidade de uma alteração constitucional para a figura tipo "impeachment" de um Presidente da República.

Desafio a alguém que tire ilações diversas das que aqui indico. Ao tecer os considerandos supra não se pode concluir ou será errado tirar a ilação de que um regime político diverso como o iniciado por António Costa seja o melhor. O tempo o dirá.  De momento existe pelo menos o prenúncio - e as 1ªs medidas aprovadas assim o indicam - de um resquício de justiça social, anteriormente desconhecido..

Não me parece que a história fale do  "cavaquismo" como uma corrente que marcou a história de Portugal, desde logo porque lhe faltou originalidade ou iniciativa. O que deste ideário se pode dizer foi o realce do seu carácter seguidista, deleitado em generalidades e banalidades que caem bem na boca de um qualquer estadista, mas fica sempre um sabor amargo quando, tratando-se de países como Portugal, com uma economia grandemente dependente, o governante se coloca na mão de baixo à espera das orientações de grandes grupos económicos ou de países com economias avançadas. Eis porque, e salvaguardadas as distâncias, o procedimento político atribuído a Cavaco Silva, mais parece ter sido uma imitação, senão mesmo decalcado nas experiências de políticos como Margaret Thatcher e Ronald Reagan. Sucede simplesmente que as consequências, dadas a fragilidade económica de Portugal e a dinâmica do movimento laboral, não permitiram, que a mentalidade autoritária suplantasse a força de democracia.